O Jardineiro foi se deitar.
Fiquei ainda atento ali na janela
observando o Jardim. Ventos sussurravam, ora mais alto ora mais brando. Havia
gotejamento, condensação de chuva, também, ora forte ora mais suave.
Logo escureceu, mas nunca tive
razão de evitar a noite negra. A observação pela janela para mim era um ofício.
Coisas que me acometiam. Claro, até minha mãe chamar ao me avistar sentado na
cadeira.
-
Filho, por onde esteve?
-
Mulher, já lhe falei que sempre estou aqui.
Minha mãe sempre insiste nisso,
me chamando para o jantar sabendo que estou à janela observando o Jardim. Ela
também observa, mas o foco dela sempre sou eu. Coisas de mãe.
Saí, então, da janela, mas meus
pensamentos registraram todos os espaços e eventos do Jardim, sendo que, ainda
fora da janela, pois é noite, estou presente ao menos em pensamento.
Na mesa do jantar uma refeição
que renova as forças de maneira constante. Minha mãe sempre tem esse cuidado.
Como um médico cuidando das feridas de um paciente, ela cuida de mim ao colocar
a mesa e me ouvir, depois de mais um dia de ofício.
-
Vi o Jardineiro rondando o local onde ficava o pinheiro.
-
Aquele pinheiro está fazendo muita falta para ele, deve ser
este o motivo.
-
Sim, mas existe muita coisa no Jardim, conhecida por ele, e
ainda muita coisa por conhecer, caso ele estivesse vendo aqui de cima, da
janela.
-
Ainda não é hora dele vir aqui. Entenda as razões dele e não
admoeste.
-
Não estou admoestando, mas apenas tentando fazer entender.
-
Não há que entender. Havia uma dedicação do Jardineiro àquele
pinheiro. E toda dedicação estabelece laços que são difíceis de serem
quebrados. Eu também sofreria por sua ausência.
-
Sei disso, mãe. Mas a verdade é que as coisas não se vão. O
pinheiro se transforma em outro tipo de vida. Ele não se perde.
-
Mas para o Jardineiro é o pinheiro quem faz sentido. Haver
outra espécie de vida para ele não suplantará a dor da perda do pinheiro. –
Disse minha mãe e, após me entregou umas sementes, ordenando que eu lançasse lá
de minha janela.
-
Sim, mãe, eu lançarei.
Sei sobre dor também. Vejo todos
os dias aqui de cima do meu apartamento. Também já vivi e suportei dores. Mas a
verdade tudo supera. É isso que deve ser pensado.
Ainda durante o jantar, ouvi o
vento batendo forte a minha porta. Sabia de sua presença, mas também não tinha
razão de se preocupar com o fenômeno. É próprio da natureza.
Mas esta noite não foi apenas um
vento que bateu a porta. Senti uma força superior ao vento trepidar a chancela
que separa minha morada e o mundo lá fora. Minha mãe até ficou um pouco
surpresa, pois, poucos são aqueles que chegam a bater a porta e pedir entrada.
Então, fui até a porta ver o que era.
Quando abri a porta não vi nada,
apesar de ter sentido a presença de alguma coisa. Eu sabia o que era. Mas
aquele que veio parecia não saber. Encorajei-o a entrar, dizendo:
-Não tenha medo. Pode aparecer.
Minha mesa está posta e ali está minha mãe. Esta é minha casa.
Respondeu o visitante:
- Apenas quero ver o Jardineiro.